Metrópole: Há uma discussão em pauta nos consultórios terapêuticos: a quantidade de diagnósticos de depressão é ou não excessiva? Para os professores Allan V. Horwitz e Jerome C. Wakefield, a psiquiatria contemporânea confunde tristeza normal com transtorno mental depressivo porque ignora a relação entre os sintomas e o contexto em que eles aparecem. No livro A tristeza perdida – Como a psiquiatria transformou a depressão em moda, os autores mostram que a tristeza, comum a todo ser humano, vem sendo tratada como doença. O senhor concorda?
Isso provavelmente é devido:
1) Ao forte lobby da indústria farmacêutica, além disso é ela que patrocina quase todas as pesquisas na área. Nos últimos anos, pesquisadores chegaram a se recusar a publicar pesquisas porque tinham resultados negativos para a indústria de medicamentos. Hoje temos muitas indicações sobre os efeitos colaterais e os problemas quando alguém tenta diminuir a dose, como mudanças súbitas de humor ou pensamento suicida, interferência na vida sexual, com a diminuição da libido, insônia, dor de cabeça, aumento de peso, náuseas, boca seca etc. Entretanto, a indústria limita ou omite os efeitos colaterais.
2) A dificuldade que os psiquiatras tem, principalmente pelo tempo curto de suas consultas (um problema relacionado aos convênios médicos que pagam mal aos seus profissionais), o que dificulta fazer uma análise para definir adequadamente o que é normal e patológico.
4) A pressão por agilidade que a competitividade capitalista imprime sobre o homem do trabalho e por conseqüência, em todas as esferas de sua vida social fez com que a sociedade estabelecesse um padrão imperativo de excelência profissional ou acadêmica. Com efeito, as pessoas desenvolveram baixa tolerância a frustração, ou seja, não conseguem lidar com o fracasso e esperam apenas uma alta performance em suas atividades.
5) A sociedade que estabelece um padrão de felicidade contínua fazendo com que as pessoas esperem ser felizes o tempo todo ou que estejam sempre de bem com a vida, tornando-se intolerantes com sentimentos amenos ou tristes. É como se a tristeza praticamente perdesse o direito de existir. E por conseqüência, as pessoas acabam se sentindo culpadas e envergonhadas na nossa sociedade quando estão tristes ou têm problemas. Proibir uma tristeza provocada por uma separação amorosa, pela perda de um ente querido, por uma decepção pessoal é eliminar um sentimento normal que deve ser vivido para que possa ser superado. Na verdade, muitas pessoas não sofrem de problemas psiquiátricos, mas apenas necessitam de apoio emocional por causa de uma intensa reação a alguma perda ou estresse em sua vida.
6) A idéia equivocada que desenvolvemos socialmente de que ninguém é normal, mas que medicamentos podem nos levar à sanidade.
O medicamento que atua diretamente no cérebro tem servido a nossa sociedade como uma solução mágica e toda solução rápida deveria ser questionada. O que se observa é que tais medicamentos tem servido mais como corrimão ou muleta e por isso não ensinam o indivíduo a andar com as próprias pernas. Em outras palavras, não produz repertório que torne a pessoa independente. Ansiolíticos, antidepressivos, antipsicóticos etc não instalam comportamentos, ou seja, não ensina como a pessoa deve se comportar diante das adversidades, tais medicamentos apenas mudam a bioquímica do organismo, alterando seus sentimentos e emoções. Imagine, por exemplo, uma pessoa diagnosticada com fobia social, que resumidamente, é o medo exagerado de lidar com duas ou mais pessoas no âmbito interpessoal. Em decorrência disso, ela vai ao médico e é prescrito um ansiolítico, ela inicia o tratamento e vai ficando mais calma perante as pessoas, mas não aprende o repertório social de como iniciar, manter e finalizar uma conversa. Ou seja, suas conversas não serão saborosas e nem estimularão seus interlocutores a mantê-las.